segunda-feira, 13 de junho de 2011

SONHO 15


Todos da casa estavam na sala, diante do televisor. Ao lado do aparelho, sentado em uma cadeira, de frente para as pessoas, estava eu. Ao que parece, podiam ver-me, se quisessem. Os olhares, no entanto, centravam-se no filme. Dali os via de uma maneira singular. Uma coreografia de olhares, expressões que se alternavam entre o riso leve e um ar de ligeira apreensão, entre a passividade e a euforia.

O tempo passava; não o transcorrer de um filme, mas de uma vida. E todos permaneciam ali. A VIDA ERA UM ESPETÁCULO DO QUAL EU SÓ PARTICIPAVA COMO ESPECTADOR; UM ESPECTADOR DE ESPECTADORES.

Levanto-me - já muito tempo passara -, sento-me no sofá, ao lado dos presentes, que não esboçam reação. TV ligado, todos olhando, eu olhando, mas não vejo o filme. Ouço a trilha musical, não as vozes.

A vida era um espetáculo carente de vozes. A despeito do espaço reduzido, a sala estava repleta; todos os familiares e alguns amigos. Eu não via o filme, via as pessoas, mas não sentia suas presenças.

A vida era um espetáculo imaterial. Um desconhecido entra na sala, olha para mim, ninguém desvia o olhar. Com um gesto, pede licença para sentar. Com a cabeça, concordo. Empurra-me um papel dobrado - nada há escrito -, oferece-me um como d'água, levanta-se e vai embora.
Sonhador: Professor universitário, 38 anos, solteiro.


In: GUIMARÃES, R. B. (org) Memória e imaginário urbano: geografia de Morpheus. Presidente Prudente: Azimute, 2006.